Risco na Serra
[DESTAQUE ● jornal Forum Ambiente nº 122, 28 de Março de 1997]
A Serra do Risco está a ser destruída pelas pedreiras que aí laboram. O alerta foi dado pelo Núcleo de Espeleologia da Costa Azul. A situação das pedreiras na Arrábida já foi levantada este ano pelo Partido Ecologista “Os Verdes”. Ricardo Paiva, o novo director do Parque Natural da Arrábida, onde estão integradas aquelas indústrias extractivas, diz que já foi possível um consenso e que até ao final do ano vai estar pronto um plano específico de ordenamento para a zona das pedreiras.
Na Serra do Risco as explorações continuam a lavrar, não cumprindo a lei e indiferentes aos impasses permanentes da política de conservação da natureza.
Serra do Risco (Arrábida) © Pedro Cuiça (digitalização do jornal Forum Ambiente 1997)
Parque Natural da Arrábida
Pedreiras pisam o Risco
[DESTAQUE ● jornal Forum Ambiente nº 122, 28 de Março de 1997]
O Núcleo de Espeleologia da Costa Azul (NECA) alerta para o actual avanço da pedreira da Sobrissul sobre a Serra do Risco, verificando-se já a destruição de parte do campo de lapiás aí existente. Integrada no Parque Natural da Serra da Arrábida (PNA), a arriba do Risco, a mais alta da Europa Continental, já foi vítima de deslizamento de terras, há cerca de quatro anos, causado pela indústria extractiva. Chegou a hora da Serra do Risco?
A indústria extractiva de rochas carbonatadas na Cadeia da Arrábida coloca indiscutíveis problemas de gestão do património natural e de conservação da natureza que têm sido, aliás, fonte de diversas polémicas.
Em meados de 94, a Quercus e a Açor defenderam que as medidas de recuperação para as áreas degradadas pelas pedreiras não eram mais que meros pró-formas somente para calar as consciências menos escrupulosas. A arriba do Risco, com cerca de 380 metros de desnível (a mais alta da Europa Continental), corria o perigo de derrocada devido à laboração da pedreira da Sobrissul a escassos metros da crista. A estratégia de recuperação exigida e prometida para as áreas que esgotaram a sua exploração estava por concretizar (tal como está), apesar dos avanços anunciados pelas autoridades nesse sentido. Por outro lado, a Delegação Regional de Indústria e Energia de Lisboa e Vale do Tejo (DRIELVT) contestava o pretendido encerramento das pedreiras da Arrábida argumentando que o plano de ordenamento consagrava a existência de pedreiras, não fazendo sentido enviar “as pessoas para casa com uma indemnização de alguns milhões de contos”.
Em 1995 decorreram negociações a fim de manter uma margem mínima de 80 metros de distância em relação à crista da arriba do Risco, incluindo os oito metros do caminho aí existente. Das negociações resultou o acordo de as pedreiras não avançarem na direcção da arriba, mas sim, em contrapartida, na Serra do Risco.
Em direcção à Serra do Risco
A extracção de rochas industriais, que se resume fundamentalmente a calcários (com a designação comercial de “pedra da Arrábida”) utilizados na produção de britas para a construção civil e obras públicas, continuam a estar no centro da polémica.
Heloísa Apolónia, deputada de “Os Verdes”, questionou, já no corrente ano, o Ministério do Ambiente sobre a situação das pedreiras existentes na Arrábida e quais as medidas que vão ser tomadas para recuperar as zonas e assegurar a qualidade de vida da população. Ricardo Paiva, director do Parque Natural da Arrábida, afirma que até ao final do ano estará concluído um plano de ordenamento específico para a zona das pedreiras, depois de se ter estabelecido com os respectivos empresários “uma plataforma de entendimento”. O diálogo com os empresários visou a negociação de “novos planos de lavra”, de modo a transferir as explorações de áreas mais sensíveis, como as arribas, para outras de menor sensibilidade ecológica ou de mais fácil recuperação.
Espera-se, igualmente, que o Plano de Exploração e Ordenamento das Pedreiras, rejeitado há três anos, fique concluído durante o segundo trimestre deste ano. Só então se poderá falar em Avaliação de Impacte Ambiental. Ricardo Paiva frisa que nunca foi emitido qualquer parecer de ampliação das explorações e que, desde a criação do parque natural, há quase 21 anos, apenas houve mudança de locais de lavra relativos a licenças concedidas anteriormente. A laboração não se pode processar em direcção à arriba do Risco. No entanto, como alternativa, é permitida a destruição do campo de lapiás situado nas faldas da serra do mesmo nome.
A implementação de medidas de um Plano de Recuperação Paisagística permitirá reduzir substancialmente a magnitude dos impactes negativos. No entanto, um campo de lapiás é de impossível recuperação, ficando irremediavelmente destruído.
As medidas de protecção do ambiente e da própria qualidade de vida consistem essencialmente na: recolha e tratamento das águas de escorrência superficial em sistemas de decantação, de forma a proceder à clarificação das águas e restituição das mesmas à circulação natural; verificação sistemática das condições de funcionamento dos sistemas de minimização das emissões de poeiras, com vista a garantir a sua correcta operacionalidade e os objectivos para que foram programados, bem como a consideração da implementação de sistemas de controlo de emissões de poeiras.
O sector da indústria extractiva reveste-se de particular importância como dinamizador da economia local, mas não se poderá desprezar os impactes negativos resultantes da sua implantação, ainda para mais se se localizam numa área protegida.
Os principais impactes produzidos pelas pedreiras reportam-se à destruição de solos e rochas; alteração d topografia e, consequente, impacte visual, modificação das águas superficiais e subterrâneas; destruição da fauna e da flora; emissão de gases e, sobretudo, poeiras; aumento dos níveis de ruído; impactes sobre bens materiais e património cultural.
[Serra do Risco (Arrábida) © Pedro Cuiça (digitalização do jornal Forum Ambiente 1997)] Poluição em pleno Parque Natural da Arrábida
O impacte de pedreiras não se limita somente à área de exploração mas também a toda uma área envolvente, mais ou menos significativa consoante o regime de ventos local. As poeiras cobrem a vegetação dificultando ou impedindo o processo fotossintético. A destruição da vegetação leva á ruptura das cadeias alimentares, à destruição dos habitats naturais. O ruído produzido pela laboração (detonações), maquinaria e constante circulação de pessoas e veículos provoca a perturbação da fauna.
O transporte de materiais extraídos da pedreira traduz-se por um claro impacte negativo na estrutura viária existente, quer aumentando o risco de acidente, nomeadamente nos atravessamentos urbanos (como na localidade de Pedreiras), quer nas condições do pavimento. Será igualmente de referir que as pedreiras em laboração junto do Risco apresentam graves lacunas no respeitante à segurança e higiene no trabalho, quer para trabalhadores quer para estranhos ao serviço, não respeitando as normas impostas por lei (Decreto-Lei nº 89/90, de 16 de Março), nomeadamente a vedação da área e a estabilização de taludes.
O Museu Nacional de História Natural (MNHN) tem vindo a conceber e propor um grande projecto à escala nacional de musealização in situ de ocorrências passíveis de serem consideradas monumentos naturais ao abrigo da legislação em vigor (Decreto-Lei 19/93, de 23 de Janeiro). Os geomonumentos, testemunhos do percurso histórico do nosso planeta, deverão ser considerados quando estejam em causa tomadas de decisão susceptíveis de influenciarem o meio físico. Ora, estando as pedreiras do Risco situadas num parque natural, mais precisamente numa área de Reserva Geológica, e verificando-se a ocorrência de formas lapiares que importa preservar a todo o custo, seria conveniente a classificação dos campos de lapiás da Serra do Rico como geomonumento.
Segundo o Decreto-Lei nº 89/90, de 16 de Março, as bordaduras das pedreiras não podem encontrar-se a menos de “500 m, relativamente a locais ou zonas com valor científico ou paisagístico”. As pedreiras não se encontram situadas à distância estipulada, estão precisamente sobre uma zona classificada. O facto de as pedreiras se localizarem num parque natural e numa reserva geológica parece não ter qualquer efeito prático. Talvez a classificação como geomonumento possa, ao aumentar a lista de atributos, resolver o que tem sido aparentemente irresolúvel.
[Serra do Risco (Arrábida) © Pedro Cuiça (digitalização do jornal Forum Ambiente 1997)] Fendas de dissecação nas poeiras causadas pela actividade das pedreiras da Serra do Risco
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Licenciamento e fiscalização de pedreiras
O licenciamento de pedreiras está sujeito, independentemente da entidade que o concede, a prévio parecer favorável da Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais (DRARN). Se a exploração se situar numa área protegida ou numa zona limítrofe, o parecer favorável terá de ser emitido pelo Instituto da Conservação da Natureza (ICN).
O licenciamento de pedreiras é da competência dos municípios caso sejam explorações a céu aberto, não excedam os 155 trabalhadores, a potência total dos meios mecânicos não ultrapasse os 500 cv e a profundidade da escavação não exceda 10 metros. Compete ao Instituto Geológico e Mineiro o licenciamento de explorações a céu aberto em que sejam excedidos os limites anteriores.
A fiscalização da actividade das pedreiras em áreas protegidas compete ao ICN. Quando se constata a existência de qualquer infracção levanta-se o respectivo auto de notícia no qual serão consignadas as deficiências ou incorrecções encontradas (artigos 48º e 49º do Decreto-Lei nº 89/90). As infracções ao disposto na legislação constituem contra-ordenação e a aplicação de coimas é da competência da câmara municipal em cuja circunscrição territorial a infracção tenha ocorrido ou do Instituto Geológico e Mineiro.
As pedreiras já estabelecidas à data da entrada em vigor da actual legislação beneficiam de um regime especial de transição, para adaptarem as suas explorações às novas exigências.
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Legislação sobre a indústria extractiva
É obrigatória a Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) em pedreiras com área superior a cinco hectares e/ou com produção anual superior a 150 mil toneladas, segundo o Decreto-Lei nº 186/90, de 6 de Junho.
O Decreto Regulamentar nº 38/90 especifica os aspectos principais de análise a salvaguardar num Estudo de Impacte Ambiental (EIA) para o caso das pedreiras.
O Decreto-Lei nº 90/90, de 16 de Março, engloba as normas aplicáveis aos recursos geológicos em geral, posteriormente complementadas por um conjunto de diplomas. De acordo com a definição legal, são recursos geológicos os bens naturais existentes na crosta terrestre e passíveis de utilização económica.
O Decreto-Lei nº 89/90, de 16 de Março, designa por massas minerais as rochas e ocorrências minerais não qualificadas legalmente como depósitos minerais. Os depósitos minerais são recursos que se integram no domínio público do Estado e sobre os quais apenas podem ser constituídos direitos de prospecção, pesquisa e/ou exploração, e, como tal, insusceptíveis de apropriação privada. As massas minerais não pertencem ao domínio público do Estado. Sobre elas podem constituir-se direitos de propriedade ou outros direitos reais de natureza privada. As zonas de defesa são zonas de terreno que circundam edifícios, obras, instalações, monumentos, acidentes naturais, áreas ou locais classificados de interesse científico ou paisagístico, nas quais é vedada a instalação de pedreiras.
As normas relativas à salvaguarda da saúde, higiene e segurança dos trabalhadores das actividades de revelação e aproveitamento dos recursos geológicos constam do Decreto-Lei nº 162/90, de 22 de Maio, que aprova o Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho nas Minas e Pedreiras.
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