28/07/2008

Furna das Pombas

Arrábida
A Garganta do Cabo

[Espeleologia ● revista Forum Ambiente Dezembro/Janeiro 2002]

O Cabo Espichel, no extremo ocidental da cordilheira da Arrábida, esconde grutas de grande interesse e beleza. A Forum Ambiente participou na visita espeleológica à Garganta do Cabo e mostra como foi.

Mulheres e campónios-pescadores das proximidades do Cabo Espichel, à soleira das pobres casas de pedra solta”, disseram ao geógrafo Orlando Ribeiro, “que era ali um dos cabos do mundo”. E o cabo do mundo subsiste, pois nem o progresso, que trouxe melhores habitações e transportes facilitados, conseguiu apagar o sentimento de finisterra. O ar carregado de salitre ou as paisagens costeiras constituem motivos suficientes para partirmos, pé-ante-pé, à descoberta dessa fronteira entre a terra e o mar.
Partimos à descoberta desse mundo que se oculta sob a terra que pisamos. O “mundo subterrâneo” que se encontra no Cabo Espichel.
A Arrábida encera inúmeras grutas e algares escavados pela acção das águas sobre a pedra calcária. Algumas dessas cavidades encontram-se precisamente no extremo ocidental da cordilheira, em pleno Cabo Espichel. Já efectuámos a descida à Grande Falha* (Forum Ambiente nº 49, Junho de 1998) e, agora, vamos conhecer a Garganta do Cabo.

Garganta do Cabo (Cabo Espichel) © Francisco Rasteiro (digitalização revista FA 2002)

Descida “subterra”
Estamos no Cabo Espichel com elementos do Núcleo de Espeleologia da Costa Azul (NECA) e da Assiciação dos Espeleólogos de Sintra (AES). Primeiro foi necessário localizar a gruta e, seguidamente, deu-se início à montagem do rapel que conduz à base da grande sala de entrada. A descida de 35 metros de altura, totalmente no vazio, termina numa plataforma situada a cerca de 15 metros acima das águas. O mar ocupa grande parte da base da grande sala de entrada, produzindo intensos e estranhos sons. Os raios de luz que penetram na sala também contribuem fortemente para o ambiente peculiar que se vive nesta cavidade.
Os pescadores da região já conheciam a entrada junto ao mar, a que chamavam “Furna”, e a entrada superior, denominada “Lapa das Pombas”. Mas terá sido o NECA que explorou pela primeira vez essa espectacular cavidade. As desobstruções efectuadas no ano da “descoberta” (1995) contribuíram para aumentar o desenvolvimento da mesma e revelaram aspectos interessantes sobre a sua génese. O conjunto de galerias preenchidas totalmente por areias de praia que, fruto dos trabalhos de desobstrução, vieram a revelar novos aspectos da cavidade são agora visitáveis em parte. Trata-se de condutas de secção arredondada e de pequenas dimensões, chamadas “gateiras” na gíria espeleológica, onde é necessário progredir por meio de técnicas de rastejamento e, por vezes, oposição. Depois de explorar essa pequena “rede” de galerias voltamos novamente à grande sala de entrada. Agora resta-nos subir os 35 metros de corda fixa que nos separam da saída da cavidade. Uma subida acompanhada por andorinhas! Depois de arrumado o material, saímos da gruta defronte de falésias impressionantes que se despenham alterosas sobre o mar. A paisagem lembra-nos que o Cabo Espichel é um dos mais belos promontórios de Portugal e a nossa experiência “subterra” revela que este esconde encantos insuspeitos.

[* A gruta que o NECA denominou “Grande Falha” já era conhecida pelas pessoas da região como “Furna dos Segredos” ou, simplesmente, “Segredos”. (28/07/08)]

Garganta do Cabo (Cabo Espichel) © Francisco Rasteiro (digitalização revista FA 2002)

Um cabo ao natural
A cadeia da Arrábida estende-se desde Setúbal ao Cabo Espichel. Essa cadeia montanhosa é formada por rochas mesocenozóicas, em geral, dobradas. No Cabo Espichel afloram essencialmente litologias carbonatadas do Jurássico, em estratos fortemente inclinados, bem como pequenos retalhos do Quaternário, correspondentes a areias com calhaus rolados e fragmentos de conchas.
Os perfis dos solos são incipientes, sendo frequentes os solos esqueléticos. Nas fissuras e concavidades dos calcários acumula-se solo húmico e terra-rossa. A vegetação varia de formações pioneiras sobre rocha e litossolos a diversos estágios de garrigue. Os Verões quentes e secos imprimem o carácter estépico da vegetação herbácea e explicam a predominância de arbustos. Os longos estios justificam as diversas adaptações xerófitas. Destacam-se igualmente associações florísticas de elevado valor botânico, numa enorme variedade de cores e aromas. As cavernas constituem outro motivo de destaque.

Atenção!
A descida à Garganta do Cabo exige o conhecmento das técnicas de descida e de subida de verticais em grutas. Aconselhamos que seja enquadrado por espeleólogos experientes e que conheçam a cavidade. Se está interessado em visitar a Garganta do Cabo não hesite, contacte o Núcleo de Espeleologia da Costa Azul e tenha a garantia de que o faz em segurança.


Bloco de notas
Localização: Cabo Espichel
Acessos: Estrada que liga Sesimbra ao Cabo Espichel (EN379)
Desenvolvimento horizontal: cerca de 150 m
Desenvolvimento vertical (rapel): 35 m
Horário: cerca de 4 horas
Dificuldade: algo difícil
Época aconselhada: todo o ano
Cartografia: Carta Militar de Portugal do Instituto Geográfico do Exército (IGeoE), na escala de 1/25000, folha 464 (Sesimbra)
Contactos úteis:
● Núcleo de Espeleologia da Costa Azul: tel. 937 770 415 ou 966 201 276
● Câmara Municipal de Sesimbra: tel. 212 233 017
● Parque Natural da Arrábida: tel. 265 524 032

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