22/10/2008

Vulcano-espeleologia (VI)

Vulcanoespeleologia
Grutas, Algares e Vulcões


[FORA DE PORTAS · jornal Forum Ambiente nº 206, 6 de Novembro de 1998]

Os Amigos dos Açores desenvolvem trabalhos de espeleologia desde há uma década. Para assinalar as comemorações, a associação anuncia a publicação de um livro que dá a conhecer as grutas e algares de S. Miguel e a espectacularidade da paisagem vulcânica.
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A associação ecológica “Amigos dos Açores”, sedeada em S. Miguel, está a comemorar uma década de trabalhos espeleológicos (ver jornal Forum Ambiente nº 179, de 1 de Maio de 1998). O interesse pelas cavidades da ilha é antigo, mas o Grupo de Trabalho de Espeleologia dos Amigos dos Açores (GTEAA) só foi criado em 1991; o que não impediu a realização de diversas cavidades. No primeiro ano (1988) foram visitadas todas as cavidades micaelenses então conhecidas. Em 1990, em colaboração com a associação espeleológica “Os Montanheiros” (ilha Terceira) e a Universidade dos Açores, efectuaram-se trabalhos de campo no âmbito do projecto “Biospel - S. Miguel”.
Dez anos de explorações no interior da Terra permitiram um maior conhecimento do património espeleológico, não só da ilha de S. Miguel, como do arquipélago, e o despoletar de medidas conservacionistas na Gruta do Carvão (ver Forum Ambiente nº 153, de 31 de Outubro de 1997).
O inventário das grutas e algares da denominada “ilha verde” tem constituído um trabalho primordial para a conservação do património subterrâneo ai existente. A obra “Património Espeleológico da ilha de S. Miguel - Grutas, Algares e Vulcões, recentemente editada pelos Amigos dos Açores (1998), dá a conhecer um pouco desse “mundo de escuridão e beleza”. Um trabalho de João Paulo Constância, João Carlos Nunes e Teófilo Braga, que proporcionou uma viagem a algumas das mais importantes cavidades micaelenses. Nas palavras de Victor Hugo Forjaz, que assina o prefácio: “Uma sínteses iniciática das principais riquezas espeleológicas de São Miguel e um alerta para os responsáveis pela conservação da natureza”.

Vulcanismo subterrâneo
As grutas estão geralmente associadas às áreas cársicas (Maciço Calcário Estremenho, Arrábida, Barrocal algarvio,…). Mas existem excepções à regra, como as Grutas de Sto. Adrião (Trás-os-Montes) ou a Cova da Adiça (Alentejo). Se em Portugal continental é assim, no arquipélago dos Açores, então, a excepção é a regra. Existem numerosas cavidades, mas são de origem vulcânica.
Para o vulcanólogo Victor Hugo Forjaz, “os vulcões quando activos, além do exibicionismo exterior, têm uma actividade interna e intima que apenas os vulcanoespeleólogos podem revelar”. Os algares e túneis de lava são a expressão dessa actividade vulcânica e constituem um mundo à espera de ser estudado.
O passado geológico de S. Miguel revela uma longa história de erupções vulcânicas, na sua maioria explosivas. Erupções que, grosso modo, fizeram com que a ilha fosse crescendo para ocidente. Como testemunhos externos do interior da Terra, destacam-se, entre outros, os aparelhos vulcânicos de Furnas, Sete Cidades e Fogo. No entanto, só descendo ao “centro” da Terra se poderá vislumbrar a outra face do vulcanismo. Actualmente conhecem-se perto de 20 cavidades naturais (e 6 artificiais), na ilha de S. Miguel, das quais mais de 60% localizam-se no Complexo Vulcânico dos Picos.
A maior parte dos algares vulcânicos correspondem a antigas chaminés ou condutas, mais ou menos verticais, que se esvaziaram dando origem a cavidades. O livro de J. P. Constância, J. C. Nunes e T. Braga dá a conhecer o Algar do Pico Queimado (o mais profundo de S. Miguel, com cerca de 30 metros), o Algar da Batalha e o Algar da Ribeirinha.
Os túneis vulcânicos ou lávicos (também designados por “grutas” ou “cavernas”) formam-se geralmente em escoadas de lavas basálticas. Quando são de pequenas dimensões e secção mais ou menos circular também se chamam “tubos lávicos”. À medida que as escoadas de lava progridem dá-se o arrefecimento das zonas superficiais (em contacto com a atmosfera). Desse modo forma-se uma crosta envolvente, debaixo da qual continua a escorrer lava ainda quente e liquefeita. Quando o nível da lava sofre um abaixamento gera-se um vazio, formando-se uma cavidade de alguns metros ou até quilómetros de desenvolvimento.
O tecto das grutas é frequentemente afectado por desabamentos rochosos, que podem originar a formação de “clarabóias”, e não é raro formarem-se pingos de lava (estalactites lávicas). Estas formam-se quando a lava ainda está liquefeita e, por vezes, esses pingos caem indo gerar estalagmites ou estafilitos. Os rebordos salientes deixados nas paredes dos túneis pelos rios de lava que correram no seu interior, designados por “bancadas” ou “balcões”, também caracterizam esse meio subterrâneo.
O maior túnel de lava de S. Miguel é a Gruta do Carvão (980 m) de que se conhecem dois troços que perfazem cerca de 2 quilómetros de desenvolvimento. J. P. Constância, J. C. Nunes e T. Braga também dão a conhecer a Gruta de Água de Pau (323 m), Gruta do Pico da Cruz (260 m), Gruta do Enforcado (235 m), Gruta do Caldeirão (235 m), Gruta do Esqueleto (188 m), Gruta das Escadinhas (135 m), Gruta da Quinta Irene (mais de 62 m), Gruta da Giesta (45 m) e Gruta das Feteiras (22 m).

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