Olhar o carso,
com olhos de ver
[FORA DE PORTAS ● jornal Forum Ambiente nº 216, 29 de Janeiro de 1999]
A apresentação dos “Documentários Vivos” decorreu, nos dias 16 e 17 de Janeiro, no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. São programas temáticos que conjugam actividades de ar livre e de interpretação da natureza. Um convite para conhecer o carso, por dentro e por fora, para melhor o preservar.
PNSAC © Tiago Petinga (1995)
Os “Documentários Vivos” foram apresentados à imprensa no fim-de-semana de 16 e 17 e Janeiro, nas espectaculares paisagens cársicas do Maciço Calcário Estremenho. Olímpio Martins e Maria João Martins guiaram os participantes na iniciativa. Os programas temáticos, que pretendem conciliar o lazer e a aventura com a interpretação do meio, levaram os jornalistas a efectuar a descida integral do Algar do Pena. Para alguns, foram os primeiros passos nas técnicas de progressão usadas na espeleologia (que incluíram travessias em corrimão e rapel), bem como nos segredos do fascinante “mundo subterrâneo”.
O carso, como não podia deixar de ser, surge como principal pólo integrador dos programas em curso. Para conhecer o carso, “Documentários Vivos” revela o modelado superficial, desvenda a escorrência das águas e relembra velhas artes e tradições. As visitas ao sistema fluviocársico dos Amiais/Olhos de Água do Alviela e a troços da Rota dos Candeeiros, Rota das Escarpas e Rota do Planalto também preencheram a agenda do fim-de-semana. Dois dias em que a gastronomia regional típica das serras d’Aire e Candeeiros surgiu como mais uma das surpresas.
“Documentários Vivos” é uma iniciativa do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC) e da Região de Turismo de Leiria, organizada pela Associação de Desenvolvimento das Serras de Aire e Candeeiros (ADSAC) e pelo Automóvel Clube de Portugal de Porto de Mós (ACPM).
Visitas, passeios e interpretação
Os “Documentários Vivos” são programas temáticos de interpretação do património natural do PNSAC e, por extensão, do Maciço Calcário Estremenho, a maior área de terrenos carbonatados (calcários e dolomias, entre outros) do país e aquela onde o modelado cársico se expressa na sua maior perfeição. As águas infiltram-se através de sistemas de escoamento subterrâneo e surgem em caudalosas nascentes (Alviela, Almonda, etc.), esculpindo formas típicas como canyons, dolinas, uvalas e polges, campos de lapiás ou grutas, entre outras. Não admira que os dois programas temáticos recentemente iniciados - “Viagens ao Centro da Terra” e “Quarenta e oito horas em tons de ocre, cinzento e verde” - estejam centrados em torno do carso.
O programa “Viagens ao Centro da Terra” envolve a visita a três grutas: uma situada na serra dos Candeeiros, outra junto da serra de Aire e ainda outra no planalto de Ato. António. Em cada uma das cavidades é abordada uma temática específica, havendo porém um denominador comum: o património espeleológico e os recursos hidrícos, a sua interpretação e integração no contexto regional. De início, somente uma das cavidades, o Algar do Pena (em que é realizada a descida integral), será alvo dessa abordagem, mas futuramente a educação ambiental ir-se-á estender às restantes.
O Algar do Pena situa-se no Vale do Mar, depressão aberta no centro sul do planalto de Sto. António (ver jornal Forum Ambiente nº 120, de 14 de Março de 1997). Descoberto em 1985, esse algar possui a maior sala conhecida no país (com um volume estimado de 105 mil metros cúbicos) e, alvo de uma intervenção cuidada, constitui hoje um centro de interpretação pioneiro. O Centro de Interpretação Subterrâneo do “Algar do Pena” é um projecto-piloto, integrado nas Rotas Europeias do Carso, que pretende sensibilizar a população em geral para a preservação do mundo subterrâneo dando-lhe, nas palavras de Olímpio Martins, a possibilidade de “conhecer a história do carso profundo”.
O programa “Viagens ao Centro da Terra” aborda igualmente diversos aspectos do carso superficial, sua relação com o carso profundo e o ciclo da água. As visitas estendem-se ao bordo norte do planalto de Sto. António (Rota das Escarpas) para apreciar “aspectos dos grandes acidentes tectónicos da região” e ao sistema fluviocársico dos Amiais/Olhos de Água do Alviela.
A gastronomia, um passeio de burro pelo Vale da Canada e pelo campo de lapiás do Ladoeiro, bem como a abordagem de diversos aspectos da flora da região, completam o pacote de três dias. O programa destina-se a maiores de 12 anos sem problemas de saúde, nomeadamente porque envolve manobras de corda durante a progressão subterrânea.
“Quarenta e oito horas em tons de ocre, cinzento e verde” percorre a três sub-unidades geomorfológicas em que classicamente se divide o Maciço Calcário Estremenho: o Planalto de S. Mamede/Serra de Aire, o Planalto de Sto. António e a Serra de Candeeiros. O nome resultou dos tons de ocre dados pelas argilas, do cinzento dos afloramentos carbonatados e do verde do coberto vegetal rico em espécies aromáticas. O programa dá a aconhecer alguns dos mais significativos testemunhos da história geológica da região onde o PNSAC se insere, recuando aos tempos jurássicos de há 200 milhões de anos atrás. Inclui passeios na serra dos Candeeiros (Rota dos Candeeiros) e no bordo norte do planalto de Sto. António (Rota das Escarpas), travessia da região central do planalto de Sto. António (Rota do Planalto) e visitas ao Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra de Aire, sistema fluviocársico dos Amiais/nascente dos Olhos de Água do Alviela, Centro de Interpretação Subterrâneo da Gruta “Algar do Pena” e Marinhas de Sal de Rio Maior.
Os interessados não necessitam de possuir equipamento ou conhecimentos técnicos para participarem. O enquadramento técnico está a cargo do Centro de Interpretação Subterrâneo da Gruta “Algar do Pena” e do Automóvel Clube de Porto de Mós. Os programas estão pensados para grupos pequenos (de 6 a 12 pessoas), sendo a razão participantes/enquadradores de 6 para 2. O equipamento, incluindo viaturas, é disponibilizado pela organização, assim como a alimentação e o alojamento. Para participar, basta contactar a Central de Coordenação de Visitas ao PNSAC, com o mínimo de 15 dias de antecedência.
Actividades de Ar Livre & Preservação da Natureza
Os “Documentários Vivos” assumem uma postura marcadamente conservacionista, subscrevendo inteiramente as orientações do PNSAC (in Naturalmente, 1992):
● Prefira itinerários documentados;
● Respeite os usos, costumes e tradições da área que visita;
● As plantas, olhe-as e respire-as… mas não as colha;
● Os animais… nada como deixá-los em paz;
● A pedra não é apenas um corpo inerte;
● Aproveite da melhor forma a sinalização;
● Cuidado com o fogo!;
● Pratique desporto nos locais aconselhados e com as necessários precauções;
● Evite ruídos desnecessários;
● Deite o lixo nos locais apropriados;
● Acampe sim… mas nos locais indicados;
● Os campos têm dono.
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