Gruta do Zambujal
Um péssimo exemplo
[FORA DE PORTAS · jornal Forum Ambiente nº 277, 4 de Abril de 2000]
Depois de duas décadas, o tão aguardado fecho da Gruta do Zambujal, que estava à beira de se concretizar, ficou apenas pelas intenções, pois os trabalhos entretanto iniciados foram destruídos.
Os trabalhos com vista ao encerramento da Gruta do Zambujal iniciaram-se no mês de Janeiro e a sua finalização estava prevista para Março. Estamos em Abril e a cavidade permanece aberta, com a agravante das obras entretanto iniciadas terem sido destruídas por desconhecidos. É incrível, mas é verdade! Com um historial de mais de duas décadas de abandono e de vandalização, o bom rumo dos acontecimentos seria de admirar. A polémica regressa assim ao Zambujal, aguardando-se o desfecho tão esperado: que a Gruta do Zambujal seja finalmente protegida dos atentados a que tem sido sujeita.
Um historial para relembrar
A descoberta da Gruta do Zambujal, em 1978, suscitou um interesse pouco usual. Foram colocados guardas junto das entradas, para evitar a vandalização do espaço e requeridos os pareceres dos geólogos Georges Zbyszewski e Octávio da Veiga Ferreira, assim como à Associação Portuguesa de Investigação Espeleológica (APIE).
A Gruta do Zambujal, com base nos pareceres emitidos, foi a primeira cavidade portuguesa a beneficiar do estatuto de “Sítio Classificado de Interesse Espeleológico” (segundo o Decreto-Lei nº 140/79, de 21 de Maio). Os especialistas salientaram que se tratava de “uma gruta espectacularmente bela, ímpar no que concerne às formações litoquímicas”. A cavidade revelou concreções raras, “em tamanha profusão e desenvolvimento”, que os levou a afirmar “não existir, em todo o território nacional, outra cavidade subterrânea conhecida que neste aspecto a ultrapasse”.
Aguardava-se uma nova era para as cavidades e carsos do país, mas tal não aconteceu. Passados poucos anos, as grades que bloqueavam as entradas da Gruta do Zambujal foram forçadas e as incursões começaram a deixar as suas marcas naquela que foi considerada a “pérola da espeleologia a sul do Tejo”. Apesar dos alertas da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza e posteriormente do NECA, durante duas décadas a gruta esteve mais ou menos ao abandono.
Actualmente, o Zambujal já não é a maravilhosa cavidade de há 20 anos. Com grande parte das concreções destruídas, parcialmente entulhada por blocos e desmoronada, o seu valor patrimonial e científico, bem como o seu aproveitamento turístico, encontram-se seriamente comprometidos. O Parque Natural da Arrábida, a Câmara Municipal de Sesimbra e o NECA não desistem, no entanto, da conservação e dinamização da gruta. Afinal, esta ainda encerra concreções de grande beleza e raridade, assim como uma importante colónia de morcegos-de-peluche (Miniopterus schereibersii) e alguns morcegos-ratos-grandes (Myotis myotis).
A Sociedade das Grutas da Senhora do Cabo, fundada a fim de efectuar a exploração turística da caverna, possui agora um excelente exemplo daquilo que o Homem não deve fazer ao património espeleológico. Uma visita turística, digamos “preventiva”, com vista a que não se cometam os erros do passado. Isto porque a destruição que se regista no Zambujal é irrecuperável e, de tão evidente, sempre pode constituir um exemplo.
A história da Gruta do Zambujal constitui um bom exemplo daquilo que supostamente não devia acontecer. A história de como o Estado, através de inúmeras entidades e burocracias, permite que decisões fundamentais, escudadas pela lei, sejam proteladas sine die. E isto perante a destruição, irrecuperável, do património espeleológico, por ironia do destino, classificado como área protegida. Resta saber protegida de quê ou de quem, visto a cavidade ser visitada por todos aqueles que o desejem.
Gruta do Zambujal (Arrábida) © Francisco Rasteiro
P.S.: Este artigo voltou a ser publicado, apenas com os devidos ajustes temporais, no jornal Forum Ambiente nº 310, de 21 de Novembro de 2000.
22/01/2009
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