Novo atentado em Sesimbra
[FORA DE PORTAS ● jornal Forum Ambiente nº 225, 6 de Abril de 1999]
O Algar dos Oliveira, descoberto no ano passado, foi misteriosamente entulhado após os trabalhos de desobstrução, motivo para mais um alerta do Núcleo de Espeleologia da Costa Azul. O património espeleológico continua a ser destruído no concelho de Sesimbra.
Algar dos Oliveira © DR
O Algar dos Oliveira foi descoberto pelo Núcleo de Espeleologia da Costa Azul (NECA), no dia 9 de Novembro de 1998, numa pedreira abandonada na área do Zambujal (concelho de Sesimbra). Tendo a actividade extractiva cessado nos anos 30, a antiga pedreira é hoje usada como vasadouro de lixo e entulho (motos, pilhas, plásticos, roupa, rádios, pneus, etc.). Nessa área encontraram-se três ou quatro algares obstruídos, tendo o NECA apostado na desobstrução do Algar da Oliveira.
Poucos meses depois da descoberta desse algar, uma equipa do NECA iniciou os trabalhos de desobstrução, tendo sido abordada prontamente pelos proprietários do terreno. Estes mostraram-se relutantes face aos trabalhos em curso, mas depois dos devidos esclarecimentos não se opuseram a que os espeleólogos efectuassem a desobstrução da cavidade. Segundo o NECA, “ao fim de um resumido esclarecimento acerca das nossas reais intenções e da importância da descoberta de uma nova gruta para o concelho e até para o país, autorizaram-nos a continuar os trabalhos, tendo-nos apenas advertido para que protegesse-mos as crianças de possíveis acidentes selando a entrada da gruta de modo a respeitar essas importantíssimas normas de segurança”.
Depois de 14 dias de trabalho de desobstrução, a uma média de 80 baldes por dia de “lama, blocos e lixo”, as equipas do NECA atingiram “10 metros de profundidade”, sendo “fortíssimas as probabilidades de encontrar seguimento para o sistema cársico”. O NECA cumpriu “escrupulosamente com o prometido”, tendo o cuidado de tapar a entrada da cavidade após cada jornada de trabalho. No entanto, depois da intensa actividade desenvolvida e dos resultados promissores, os espeleólogos do NECA constataram o entulhamento da cavidade. A acção, tão brusca quanto inexplicável, despertou a indignação daqueles que depositaram tantas esperanças no novo algar, que poderia dar acesso à rede subterrânea. Não se conhecem os autores de tal acção ou as motivações que a desencadearam, mas os resultados estão à vista, ou melhor, os resultados não estão à vista porque foram entulhados. A Câmara Municipal de Sesimbra está ao corrente da situação e o NECA aguarda, agora, os resultados do processo em curso. “Só nos resta esperar que se faça justiça e que as consequências de actos deste tipo, sejam sentidas pelos infractores”, salientam os espeleólogos do NECA.
Grutas ao abandono
A espeleologia encerra uma componente rara nos dias de hoje: a descoberta. Com efeito, ainda é possível ter a imensa alegria de descobrir novas cavidades, salas de grande beleza ou galerias inexploradas. O Carso da Arrábida não é excepção e o NECA assim o tem demonstrado. O Algar dos Oliveira constitui mais um exemplo das frequentes descobertas de grutas na Cadeia da Arrábida. A prospecção e descoberta de cavidades são fundamentais para a inventariação do património espeleológico de uma determinada área. Património que urge conhecer para preservar. As grutas, testemunhos do percurso histórico do planeta, constituem, sem dúvida, geomonumentos que devem ser preservados. Mas, para a sua efectiva protecção, antes de mais, será necessário saber quantas são, onde se situam e quais as suas características. Sem esse trabalho apenas se poderão efectuar intervenções pontuais, como será o infeliz exemplo da Gruta do Zambujal. Dar novos mundos ao mundo será, pois, uma tarefa de grande importância, para que não se repitam os erros do passado. É caso para os espeleólogos do NECA dizerem: “Deixem-nos trabalhar!”.
Algar dos Oliveira © DR
Zambujal
Tudo na mesma
A Gruta do Zambujal foi descoberta em 1978 e, passado pouco tempo, tornou-se a primeira cavidade portuguesa a beneficiar do estatuto de Sítio Classificado de Interesse Espeleológico (segundo o Decreto-Lei nº 140/79, de 21 de Maio). Depois foi lentamente votada ao esquecimento!
A gruta esteve mais ou menos ao abandono, à mercê de incursos antrópicas que se traduziram na destruição e pilhagem de concreções. A actividade extractiva, a menos de 500 metros de distância da cavidade (o que contraria o disposto no Decreto-Lei nº 89/90, de 16de Março) foi igualmente questionada. Para alguns, a destruição que se verificou no interior da cavidade resultou fundamentalmente de vandalismo. Para outros, a extracção de pedra foi a causadora dos impactes verificados (ver jornal Forum Ambiente nº 134, de 20 de Junho de 1997). A frente de desmonte junto da Gruta do Zambujal foi abandonada, apesar da actividade extractiva continuar na área leste da Serra dos Pinheirinhos e Ribeira do Cavalo. O problema das visitas, que continuam a processar-se impunemente, ainda subsiste.
O ano de 1998 encerrou-se, mas a Gruta do Zambujal continuou aberta. As previsões apontaram posteriormente, para um “fecho provisório” em Fevereiro do corrente ano (ver jornal Forum Ambiente nº 214, de 15 de Janeiro de 1999). O mês de Abril aproxima-se e a gruta permanece “aberta ao público”. O regulamento do Sitio Classificado da Gruta do Zambujal tinha seis meses para entrar em vigor, mas também aguarda melhores dias.
Sem comentários:
Enviar um comentário