Abismos (Cerro da Cabeça) © João Humberto Viegas/CEEAA (1978)
"MONCARAPACHO
Nesta freguesia não há uma lenda completa: tudo se reduz a referências vagas de mouras encantadas e encantamentos circunscritos a certos lugares da freguesia.
No começo do serro da Cabeça, ao lado do mar, existe uma cavidade cercada de pedras, uma espécie de pequena sala, que vai comunicar para um grande Algueirão, denominado o Abismo. Esta grande caverna tem diversas câmaras e diferentes ramificações.
Como o próprio nome indica, tem uma enorme profundidade, onde não chega a luz do sol, oferecendo a quem a visita um aspecto medonho e horrível. Se os poetas da Grécia a visitassem, colocariam ali o palácio da morte: aquilo não é apenas uma caverna é um inferno.
É tradição corrente entre os habitantes dos sítios vizinhos que aquela caverna se comunica subterraneamente com o castelo de Tavira, comunicação de que faziam uso os mouros no tempo em que dominavam a província do Algarve.
Junto da caverna têm sido encontrados objectos de uma feição estranha, como machados de pedra polida e outros de origem neolítica, que os habitantes daquela freguesia consideram de origem sarracena. Estes objectos aparecidos uma ou outra vez têm sido atribuídos ao trabalho manual dos mouros que ficaram encantados depois da expulsão da sua raça.
No mesmo serro e não distante desta caverna, há mais duas, cujas denominação são características - Ladroeira Grande e Ladroeira Pequena. Não será talvez difícil procurar a origem destes nomes, sabendo-se que ali se acolheram em 1883 os facínoras que assaltavam os pobres moradores dos sítios próximos, servindo aqueles dois antros de verdadeiras cavernas de Caco. No Algôs, povoação do concelho de Silves, há no sítio do Guiné, uma semelhante caverna onde por muitos anos se escondeu um grande criminoso conhecido pelo Diogo do Guiné.
Também a voz vaga afirma que nestas estão encantados alguns mouros, fugidos do castelo de Tavira, quando este foi tomado pelo grande D. Paio; assim como também se diz que estas duas cavernas se comunicavam subterraneamente com a grande caverna do Abismo.
Existe entre o nosso algarvio a constante tradição que afirma comunicarem-se todos os castelos da província entre si subterraneamente; e raro será encontrar algum desses grandes algueirões, cavernas ou furnas, que os habitantes dos próximos sítios não digam que se comunicam com o castelo mais próximo.
Como em quase todas as freguesias do Algarve onde aparecem tais cavernas, na freguesia de Moncarapacho há a opinião de que os mouros a habitaram em tempo, e que ainda hoje ali se conservam encantados. Para confirmar essa opinião, contam-se diversas histórias de indivíduos que foram surpreendidos de noite por aqueles misteriosos seres. As cavernas são para o nosso povo uma espécie de mapa corográfico dos sarracenos. Onde encontra uma caverna, ali lhe parece uma antiga residência mourisca, que ainda hoje conserva como reféns um triste mouro ou uma formosa moura, mas encantados.
(…)"
Francisco Xavier d’Ataíde Oliveira (1842-1915)
in As Mouras Encantadas e os Encantamentos do Algarve (1898)
No começo do serro da Cabeça, ao lado do mar, existe uma cavidade cercada de pedras, uma espécie de pequena sala, que vai comunicar para um grande Algueirão, denominado o Abismo. Esta grande caverna tem diversas câmaras e diferentes ramificações.
Como o próprio nome indica, tem uma enorme profundidade, onde não chega a luz do sol, oferecendo a quem a visita um aspecto medonho e horrível. Se os poetas da Grécia a visitassem, colocariam ali o palácio da morte: aquilo não é apenas uma caverna é um inferno.
É tradição corrente entre os habitantes dos sítios vizinhos que aquela caverna se comunica subterraneamente com o castelo de Tavira, comunicação de que faziam uso os mouros no tempo em que dominavam a província do Algarve.
Junto da caverna têm sido encontrados objectos de uma feição estranha, como machados de pedra polida e outros de origem neolítica, que os habitantes daquela freguesia consideram de origem sarracena. Estes objectos aparecidos uma ou outra vez têm sido atribuídos ao trabalho manual dos mouros que ficaram encantados depois da expulsão da sua raça.
No mesmo serro e não distante desta caverna, há mais duas, cujas denominação são características - Ladroeira Grande e Ladroeira Pequena. Não será talvez difícil procurar a origem destes nomes, sabendo-se que ali se acolheram em 1883 os facínoras que assaltavam os pobres moradores dos sítios próximos, servindo aqueles dois antros de verdadeiras cavernas de Caco. No Algôs, povoação do concelho de Silves, há no sítio do Guiné, uma semelhante caverna onde por muitos anos se escondeu um grande criminoso conhecido pelo Diogo do Guiné.
Também a voz vaga afirma que nestas estão encantados alguns mouros, fugidos do castelo de Tavira, quando este foi tomado pelo grande D. Paio; assim como também se diz que estas duas cavernas se comunicavam subterraneamente com a grande caverna do Abismo.
Existe entre o nosso algarvio a constante tradição que afirma comunicarem-se todos os castelos da província entre si subterraneamente; e raro será encontrar algum desses grandes algueirões, cavernas ou furnas, que os habitantes dos próximos sítios não digam que se comunicam com o castelo mais próximo.
Como em quase todas as freguesias do Algarve onde aparecem tais cavernas, na freguesia de Moncarapacho há a opinião de que os mouros a habitaram em tempo, e que ainda hoje ali se conservam encantados. Para confirmar essa opinião, contam-se diversas histórias de indivíduos que foram surpreendidos de noite por aqueles misteriosos seres. As cavernas são para o nosso povo uma espécie de mapa corográfico dos sarracenos. Onde encontra uma caverna, ali lhe parece uma antiga residência mourisca, que ainda hoje conserva como reféns um triste mouro ou uma formosa moura, mas encantados.
(…)"
Francisco Xavier d’Ataíde Oliveira (1842-1915)
in As Mouras Encantadas e os Encantamentos do Algarve (1898)
[Notícias de Loulé, 2ª ed., Loulé, 1996, pp. 171-172]
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