Das 26 espécies de morcegos conhecidas em Portugal - 24 no continente e duas específicas das ilhas [Morcego-dos-Açores (Nyctalus azoreum) e Morcego-da-Madeira (Pipistrellus maderensis)] -, que constituem cerca de 40% da fauna de mamíferos terrestres, cerca de metade são cavernícolas. Tal como no resto da Europa, a situação destes animais é particularmente grave. Das 11 espécies de mamíferos terrestres classificadas “em perigo” no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (1990) nove são morcegos cavernícolas. Na verdade, com excepção de Miniopterus schereibersii, espécie considerada vulnerável, todas as espécies cavernícolas foram classificadas como estando em perigo e a sua sobrevivência será improvável se os factores limitantes continuarem a actuar (Palmeirim & Rodrigues, 1992).
Há evidência de perdas importantes para os quirópteros cavernícolas e razões para acreditar que o declínio das populações se vai acentuar no futuro breve. Entre as razões do declínio das populações de morcegos, para além da destruição dos biótopos de alimentação, da utilização de pesticidas e da perturbação dos abrigos, acrescenta-se a destruição de abrigos e, em alguns países, os estudos científicos.
A perturbação dos abrigos continua a ser apontada como a causa mais importante do declínio dos morcegos cavernícolas no nosso país. “Até muito recentemente as grutas portuguesas eram pouco perturbadas por visitantes. O baixo nível de escolaridade da população em geral permitia o estabelecimento de superstições que impediam a entrada nas grutas. Por outro lado, eram poucas as pessoas que dispunham do equipamento e conhecimentos necessários para as explorar. Mas esta situação alterou-se profundamente nos últimos anos, com o aumento do nível geral de escolaridade e com a proliferação de agrupamentos juvenis, que com frequência incluem a exploração de grutas nas suas actividades. (Palmeirim & Rodrigues, 1992)”
Nas últimas duas décadas a realidade socio-cultural do país sofreu profundas alterações e essa transformação não esteve alheada do meio espeleológico. A crescente sensibilização dos espeleólogos e o envolvimento de algumas associações nos estudos em curso é inegável, sendo a perturbação dos quirópteros desviada para outros públicos. “Algumas associações de espeleologia cultivam o respeito pelos morcegos cavernícolas e os seus membros evitam perturbar estes animais. No entanto, existem muitas outras organizações juvenis ou grupos de independentes que visitam com grande frequência algumas grutas, sendo o seu comportamento por vezes muito prejudicial.
A perturbação por visitantes é particularmente grave nas grutas com fácil acesso que abrigam grandes colónias de morcegos. É esta a situação das colónias do Algarve, que são por esta razão as mais ameaçadas do país (Palmeirim & Rodrigues, 1992).”
Os abrigos subterrâneos (naturais e artificiais), disponíveis para as espécies cavernícolas, são relativamente poucos e a sua destruição por parte do Homem tem consequências drásticas. A destruição de cavidades sem ser frequente não deixa de ocorrer e as consequências nefastas a diversos níveis são difíceis de negar.
Por último, em muitos países europeus as populações de morcegos cavernícolas foram gravemente afectadas por actividades de investigação mal conduzidas. A perturbação frequente de colónias e a manipulação descuidada de morcegos provocaram o abandono de algumas grutas, ou mesmo a morte de muitos indivíduos. Mas a mais destrutiva das actividades ligadas à investigação foi a anilhagem desadequada de grandes números de morcegos (Palmeirim & Rodrigues, 1992).
A fim de proteger as populações de quirópteros cavernícolas há necessidade de regulamentar o acesso de pessoas às grutas de maior importância como abrigo de morcegos. Mas para alterar a situação de ameaça dos morcegos é necessário não só proteger a espécie directamente, mas também preservar os seus abrigos e áreas de caça.
As espécies com hábitos cavernícolas são as mais ameaçadas, sendo a perturbação dos seus abrigos por visitantes considerada a principal causa desta situação (Rodrigues & Palmeirim, 1996). Para minimizar esta perturbação têm sido utilizadas diversas barreiras de protecção dos abrigos; os gradeamentos têm demonstrado ser a barreira mais eficaz no bloqueio da passagem de visitantes, mas a sua utilização nem sempre se tem mostrado positiva para as populações de morcegos. Essa situação foi atribuída a dois factores: a relutância de algumas espécies em atravessar essas barreiras e o aumento da predação na entrada, devido principalmente a alterações do comportamento de voo induzidas pela presença das grades. Por outro lado, o tempo tem mostrado, repetidamente, que essa solução não consegue resolver o problema do acesso de pessoas às grutas porque, invariavelmente, essas estruturas são vandalizadas. As possíveis alterações climáticas provocadas pela instalação dessas estruturas também devem ser tidas em consideração.
Para além das medidas de protecção in situ de abrigos de morcegos, são igualmente de grande interesse os estudos, desenvolvidos por Luísa Rodrigues e Jorge Palmeirim, de quantificação do nível de perturbação de morcegos por parte de visitantes. Saliente-se que aquilo que tínhamos assinalado de forma empírica, em 1988, para a cavidade designada “Loulé III” (Rodrigues & Palmeirim, 1996) como sendo dos abrigos de morcegos mais perturbados do país, "com centenas de visitantes por ano", se veio a confirmar através de um registador digital, colocado entre 18 de Agosto de 1995 e 6 de Abril de 1996. Foram detectadas 100 visitas durante o período estudado, 62 das quais ocorridas em fins-de-semana ou feriados (Rodrigues & Palmeirim, 1996). Com taxas de frequência desta dimensão, a que se associam frequentes actos de vandalismo (que passaram pela destruição da vedação colocada à entrada da gruta ou graffitis no interior da mesma), é difícil promover uma conservação eficaz...
Bibliografia
PALMEIRIM, Jorge M. & RODRIGUES, Luísa (1992): Plano Nacional de Conservação dos Morcegos Cavernícolas;
Estudos de Biologia e Conservação da Natureza, nº 8, Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, Lisboa, pp. 166.
RAINHO, Ana et al. (1998): Morcegos das Áreas Protegidas Portuguesas (I);
Estudos de Biologia e Conservação da Natureza, nº 26, Instituto de Conservação da Natureza, Lisboa, pp. 166.
RODRIGUES, Luísa & PALMEIRIM, Jorge M. (1996): Avaliação do impacto do encerramento de cavidades para protecção de colónias de morcegos cavernícolas;
Há evidência de perdas importantes para os quirópteros cavernícolas e razões para acreditar que o declínio das populações se vai acentuar no futuro breve. Entre as razões do declínio das populações de morcegos, para além da destruição dos biótopos de alimentação, da utilização de pesticidas e da perturbação dos abrigos, acrescenta-se a destruição de abrigos e, em alguns países, os estudos científicos.
A perturbação dos abrigos continua a ser apontada como a causa mais importante do declínio dos morcegos cavernícolas no nosso país. “Até muito recentemente as grutas portuguesas eram pouco perturbadas por visitantes. O baixo nível de escolaridade da população em geral permitia o estabelecimento de superstições que impediam a entrada nas grutas. Por outro lado, eram poucas as pessoas que dispunham do equipamento e conhecimentos necessários para as explorar. Mas esta situação alterou-se profundamente nos últimos anos, com o aumento do nível geral de escolaridade e com a proliferação de agrupamentos juvenis, que com frequência incluem a exploração de grutas nas suas actividades. (Palmeirim & Rodrigues, 1992)”
Nas últimas duas décadas a realidade socio-cultural do país sofreu profundas alterações e essa transformação não esteve alheada do meio espeleológico. A crescente sensibilização dos espeleólogos e o envolvimento de algumas associações nos estudos em curso é inegável, sendo a perturbação dos quirópteros desviada para outros públicos. “Algumas associações de espeleologia cultivam o respeito pelos morcegos cavernícolas e os seus membros evitam perturbar estes animais. No entanto, existem muitas outras organizações juvenis ou grupos de independentes que visitam com grande frequência algumas grutas, sendo o seu comportamento por vezes muito prejudicial.
A perturbação por visitantes é particularmente grave nas grutas com fácil acesso que abrigam grandes colónias de morcegos. É esta a situação das colónias do Algarve, que são por esta razão as mais ameaçadas do país (Palmeirim & Rodrigues, 1992).”
Os abrigos subterrâneos (naturais e artificiais), disponíveis para as espécies cavernícolas, são relativamente poucos e a sua destruição por parte do Homem tem consequências drásticas. A destruição de cavidades sem ser frequente não deixa de ocorrer e as consequências nefastas a diversos níveis são difíceis de negar.
Por último, em muitos países europeus as populações de morcegos cavernícolas foram gravemente afectadas por actividades de investigação mal conduzidas. A perturbação frequente de colónias e a manipulação descuidada de morcegos provocaram o abandono de algumas grutas, ou mesmo a morte de muitos indivíduos. Mas a mais destrutiva das actividades ligadas à investigação foi a anilhagem desadequada de grandes números de morcegos (Palmeirim & Rodrigues, 1992).
A fim de proteger as populações de quirópteros cavernícolas há necessidade de regulamentar o acesso de pessoas às grutas de maior importância como abrigo de morcegos. Mas para alterar a situação de ameaça dos morcegos é necessário não só proteger a espécie directamente, mas também preservar os seus abrigos e áreas de caça.
As espécies com hábitos cavernícolas são as mais ameaçadas, sendo a perturbação dos seus abrigos por visitantes considerada a principal causa desta situação (Rodrigues & Palmeirim, 1996). Para minimizar esta perturbação têm sido utilizadas diversas barreiras de protecção dos abrigos; os gradeamentos têm demonstrado ser a barreira mais eficaz no bloqueio da passagem de visitantes, mas a sua utilização nem sempre se tem mostrado positiva para as populações de morcegos. Essa situação foi atribuída a dois factores: a relutância de algumas espécies em atravessar essas barreiras e o aumento da predação na entrada, devido principalmente a alterações do comportamento de voo induzidas pela presença das grades. Por outro lado, o tempo tem mostrado, repetidamente, que essa solução não consegue resolver o problema do acesso de pessoas às grutas porque, invariavelmente, essas estruturas são vandalizadas. As possíveis alterações climáticas provocadas pela instalação dessas estruturas também devem ser tidas em consideração.
Para além das medidas de protecção in situ de abrigos de morcegos, são igualmente de grande interesse os estudos, desenvolvidos por Luísa Rodrigues e Jorge Palmeirim, de quantificação do nível de perturbação de morcegos por parte de visitantes. Saliente-se que aquilo que tínhamos assinalado de forma empírica, em 1988, para a cavidade designada “Loulé III” (Rodrigues & Palmeirim, 1996) como sendo dos abrigos de morcegos mais perturbados do país, "com centenas de visitantes por ano", se veio a confirmar através de um registador digital, colocado entre 18 de Agosto de 1995 e 6 de Abril de 1996. Foram detectadas 100 visitas durante o período estudado, 62 das quais ocorridas em fins-de-semana ou feriados (Rodrigues & Palmeirim, 1996). Com taxas de frequência desta dimensão, a que se associam frequentes actos de vandalismo (que passaram pela destruição da vedação colocada à entrada da gruta ou graffitis no interior da mesma), é difícil promover uma conservação eficaz...
Bibliografia
PALMEIRIM, Jorge M. & RODRIGUES, Luísa (1992): Plano Nacional de Conservação dos Morcegos Cavernícolas;
Estudos de Biologia e Conservação da Natureza, nº 8, Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, Lisboa, pp. 166.
RAINHO, Ana et al. (1998): Morcegos das Áreas Protegidas Portuguesas (I);
Estudos de Biologia e Conservação da Natureza, nº 26, Instituto de Conservação da Natureza, Lisboa, pp. 166.
RODRIGUES, Luísa & PALMEIRIM, Jorge M. (1996): Avaliação do impacto do encerramento de cavidades para protecção de colónias de morcegos cavernícolas;
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