10/09/2008

Espeleo-edições (I)

Espeleologia
Editar um livro

[FORA DE PORTAS ● jornal Forum Ambiente nº 194,14 de Agosto de 1998]

Planalto de Sto. António © SubTERRA (1997)

A associação espeleológica SubTERRA realizou um inventário das grutas e algares da freguesia da Serra de Sto. António. Agora pretende ver o trabalho publicado, mas as dificuldades são muitas. O eterno problema da falta de meios de que os espeleólogos se queixam.

O Grupo de Espeleologia SubTERRA, sediado em Torres Novas, desde a sua fundação (em 1993) que vem desenvolvendo um trabalho contínuo de inventariação das cavidades da freguesia de Serra de Sto. António. A Forum Ambiente esteve com o grupo SubTERRA, no lugar de Vale do Pombo (Planalto de Sto. António), para visitar o Algar da Marradinha do Daniel (também denominado “Algar do Mata Cães”) e conhecer essa associação espeleológica. Associação que pretende editar uma compilação dos trabalhos realizados, mas que se depara com diversas dificuldades.

Grutas e Algares de Sto. António
Algar do Alto dos Crutos, Algar do Alto dos Crutos II, Gruta da Arroteia Nova, Algar da Arroteia Nova, Cova do Penedo Padrão, Lapa da Marradinha, Algar das Covas Giesteiras, Algar dos Penedos da Queimada, são algumas das muitas grutas e algares da freguesia de Serra de Sto. António. Actualmente, o grupo SubTERRA conta com cerca de 80 cavidades devidamente inventariadas e topografadas. “a cota mais profunda, menos 85 metros, encontra-se nas galerias maiores da Gruta das Marradinhas, também conhecida por Marradinhas 2”, esclarece Fernando Canais, da SubTERRA. “O Algar do Leitão é a maior vertical directa, com 27 metros, e o Algar da Chapa, o mais profundo, com 69 metros divididos por troços”, salienta João Paulo Fernandes, da mesma associação.
Os trabalhos de campo resultaram num volumoso conjunto de dados e topografias. Material que, após compilação efectuada por Fernando Canais, João Paulo Fernandes e Maria Moleiro, permitiu a feitura de trabalho que a SubTERRA pretende ver agora publicado. A compilação, em que também participaram Carlos Ribeiro e Pedro Mesquita, está, no entanto, com dificuldades para ver a luz do dia. O Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC) não apoiou a edição da obra e os espeleólogos aguardam melhores notícias de outros possíveis “patrocinadores”.

Livros sobre cavernas?
Em Portugal, a bibliografia “espeleológica” apesar de ser numerosa é bastante específica. Os trabalhos, alguns remontando ao século passado [séc. XIX], dedicam-se sobretudo a aspectos ligados à arqueologia e à biologia. “Antiguidades Monumentaes do Algarve” (1886), de Estácio da Veiga, “Reconhecimento Scientifico dos Jazigos de Marmore e de Alabastro de Santo Adrião e das grutas comprehendidas nos mesmos jazigos” (1887), de Nery Delgado, “A importância das grutas em Pré-História” (1963), de G. Zbyszewski ou “Voyage au Portugal du Dr. K. Lindberg (Resultats Zoologiques)” (1962), onde se encontra o trabalho de Lindberg “Notes sur quelques grottes et aperçu de leurs faune”, são somente alguns exemplos.
Pelo contrário, os trabalhos que focam o carso, propriamente dito, ou as grutas, como objecto de estudo em si, são bastante mais raros. O primeiro texto dedicado às grutas nacionais, “Portugal Subterrâneo – Ensaio de Espeleologia Portuguesa” (1925), deve-se a Ernest Fleury. Esse autor já tinha, aliás, publicado outros trabalhos, de que se destacam: “Sur la morphologie du Massif de Porto-de-Moz” (1916), “Sur l’Hidrologie Souterraine de l’Alviela” (1916) e “Les lapiés des calcaires au nord du tage” (1918).
O “Inventário das cavernas calcárias de Portugal” (1948), de António de Barros Machado e Bernardino de Barros Machado, ainda é uma obra de referência, pois indica 343 cavidades. A Sociedade Portuguesa de Espeleologia (SPE) publicou, em 1974, o “Inventário das Grutas de Portugal: I – Concelho de Vila Nova de Ourém”, onde se referem 53 cavidades. “Cavernas com interesse cultural encontradas em Portugal” (1982), de Octávio da Veiga Ferreira, apresenta cerca de 90 cavidades. “Grottes et Algares du Portugal” (1985), de C. Thomas, aborda as cavidades do Maciço Calcário Estremenho. Os exemplos não são muito mais.
As revistas e pequenas publicações de clubes começaram a surgir tímida e tardiamente fornecendo igualmente informações acerca de diversas cavidades. “Algarocho” (1976) e “Algar” (1987), da SPE; “A Gruta”, do Clube de Espeleologia de Coimbra (1977); “Espeleo Divulgação” do Núcleo de Espeleologia da Associação dos Estudantes da Universidade de Aveiro (1982); “Morcego” do Núcleo de Espeleologia do Centro de Estudos e Protecção do Património de Tomar (1983); “Almondinha” da Sociedade Torrejana de Espeleologia (1987); “Trogle” da Associação de Estudos Subterrâneos e Defesa do Ambiente de Torres Vedras (1995), etc..
Os arquipélagos dos Açores e Madeira não ficaram esquecidos. “Notas sobre a “Furna de Henrique Maciel (Pico, Açores)” (1963), de V. H. Forjaz, ou “Contribuição para o estudo espeleológico da Ilha do Pico (Açores)” (1972), de Luís M. Arruda são apenas dois exemplos. Sem esquecer “Caves and Pits from the Azores with some Coments on their Geological Origin, Distribution and Fauna” (1992), de P. A. V. Borges, A. Silva e F. Pereira, apresentado no 6º Simpósio Internacional de Vulcanoespeleologia (Havai, Agosto de 1991) ou “Caves ans Pits from the Azores. II – An Annotated Checklist” (1993), dos mesmos autores.
E. A. Martel, considerado o pai da espeleologia escreveu no seu livro “Les Abîmes” (1894): “Les sous sol de l?Espagne et du Portugal a été moins explore même que celui de l’Italie”. Actualmente existe bem mais informação acerca dos carsos e cavernas de Portugal. Mas, há ainda muito por fazer, nomeadamente no que se refere à edição de trabalhos realizados. Refira-se, a titulo de curiosidade, que A. e B. de Barros Machado no seu inventário (1948) indicam somente a existência de uma cavidade (Algar da Cheira) na freguesia de Serra de Sto. António. A SubTERRA já inventariou 78 grutas e algares, mas não encontra os meios necessários para editar a compilação realizada. A eterna falta de meios de que se queixam os espeleólogos e que resulta frequentemente na perda de informações, quantas vezes, irrecuperáveis.

Sem comentários: