06/03/2008

Cabeça protegida

O Cerro da Cabeça como Área Protegida

[Jornal O Algarve · Ano 87º, nº 4369, 9 a 15/Fev. 1995]

Cerro da Cabeça @P. Cuiça (2008)

Pensamos que é urgente tomar as medidas de protecção da Gruta da Senhora e defendemos a classificação do Cerro da Cabeça como Área de Paisagem Protegida ou Sítio Classificado.
O Cerro da Cabeça (249 m) situa-se a cerca de 2.5 km a NNE de Moncarapacho (Distrito de Faro, Concelho de Olhão, Freguesia de Moncarapacho). Nesse cerro encontra-se o mais espectacular megalapiás do Algarve, onde dominam os grandes dorsos de superfícies arredondadas, relevos cónicos e pedunculados, torres, blocos, etc., distribuindo-se densamente por toda a elevação (J. A. Crispim, 1982). As torres e dorsos estão separados por fendas entulhadas de calhaus, que por vezes constituem pias, ou por corredores. As pias escavadas no lapiás prolongam-se frequentemente em profundidade por algares geralmente de boca estreita e obstruídos por detritos clasticos (ex. Algar do Próximo), mas por vezes dão acesso a profundas cavidades (ex. Algar Maxila). No Cerro da Cabeça localizam-se as formas endocársicas mais profundas, de que se tem conhecimento, na região algarvia: Algar Maxila (> 95 m), Algar Medusa (78 m), 056 GEAM (> 50 m), etc..
Consta que o CEEAA, extinto há alguns anos, terá efectuado a inventariação de mais de uma centena de cavidades nesse cerro. Número mítico ou real? Não se pode averiguar pois os estudos desse Centro encontram-se encerrados no “olvídio das gavetas” da sua sede sita em instalações da Santa Casa da Misericórdia de Moncarapacho. No entanto, já no século XVI dizia-se que a “Cabeça de Moncarapacho” tinha “tantas covas e furnas contrapassadas que se podem esconder nele mil homens sem serem vistos, nem achados” (in Cadernos da Revista de História Económica e Social, nº 39).
Em 1758, o Padre Manuel Mendes Corrêa informou a existência de “uma cova chamada abismo”, “outra cova, a que chamam Ladroeira” e ainda uma outra “de fronte desta” (in F. X. d’Athaide Oliveira, 1906). Estácio da Veiga (1886) faz referência ao "Abysmo", Ladroeira Grande e Ladroeira Pequena. A. de Barros Machado e B. de Barros Machado (1948) referem o grande interesse zoológico das grutas Abismo Novo e Algueirão do Garrafão (este último com guano de morcego); além disso, referem a existência do Abismo Velho, Ladroeira Grande, L. Pequena e Algueirão da Pechinha (este com localização incerta). Em 1982, O. da Veiga Ferreira volta a referir o grande interesse zoológico do Abismo Novo e Algueirão do Garrafão; este autor, aponta, também, as grutas Abismo e Ladroeiras como tendo fornecido elementos do Neo-eneolítico ou Calcolítico (in G. Manupella et al., 1987). Costa Almeida (1979) e J. A. Crispim (1982) referem a existência de numerosas e importantes cavidades, conhecendo-se cerca de 30; no entanto, actualmente esse número ascende a mais de 50 (P. Cuiça, inéd.).
O elevado estado de degradação que se verifica em muitas grutas do Cerro da Cabeça (geralmente as concreções estão partidas e encontra-se lixo no seu interior); o estado ruinoso em que o miradouro e casa abrigo se encontram; o lixo existente em certos locais, a situação intolerável que se verifica com a Gruta da Senhora; assim como a acção da pedreira situada a SE dessa elevação perspectivam a perda de uma das mais pitorescas zonas do carso algarvio.
Porque o Cerro da Cabeça apresenta, entre outros pólos de interesse:
1) Uma geomorfologia cársica expressa de modo excepcional constituindo um megalapiás de características únicas em todo o Algarve;
2) Um grande número de grutas e a ocorrência das formas endocársicas mais profundas da região algarvia;
3) A presença de cavernas com grande interesse zoológico (fauna cavernícola) e colónias de morcegos;
4) A ocorrência de cavidades com vestígios arqueológicos;
5) Um núcleo relativamente bem preservado de chaparral mediterrânico (garrigue);
6) Uma fauna abundante (nomeadamente avifauna e pequenos mamíferos, com ocorrência de espécies relativamente raras;
é urgente que se implementem as necessárias medidas de conservação/prevenção, legislando no sentido de torná-lo uma Área de Paisagem Protegida ou Sítio Classificado.
Cerro da Cabeça @P. Cuiça (2008)

Sem comentários: