05/11/2012

OUTRA VEZ A LUA?


Acabo de chegar da minha terceira viagem às Canárias. Da primeira vez tratou-se de uma visita, se assim se poderá dizer, com uma importante componente espeleológica: tive oportunidade de conhecer alguns túneis vulcânicos em Tenerife e El Hierro. Esta foi, sem dúvida, uma visita tão inesquecível quanto marcante sob vários níveis… E certamente não terá sido por conhecer os “perritos calientes con papas locas”!
Da segunda vez o “assunto” que me conduziu a esse arquipélago foi o pedestrianismo: participei numas Jornadas de Senderismo em que, numa “escapadela”, acabei por subir até ao cume do Teide, juntamente com dois companheiros espanhóis, numa noite memorável (e, na descida, visitei a Cueva del Hielo)… Escusado será dizer que após essa “directa” cheguei a horas de participar nos trabalhos das Jornadas aparentemente como se nada se tivesse passado :) Curiosamente, nessa ocasião, também regressei a El Hierro onde fiz um percurso impressionante pelo desnível vencido e pela beleza da paisagem. Foi no final dessa segunda “visita” que recebi a notícia marcante da morte de um companheiro nos Himalaias…
Desta feita, a terceira, o motivo pelo qual estive nas Canárias voltou a ser o pedestrianismo. Invariavelmente fiquei “preso” à visão do Teide e recorrentemente, quer nas deslocações em veículos motorizados quer nos passeios a pé, percorri a paisagem com o olhar atraído pelos inúmeros “buracos” que aí se encontram…
O motivo pelo qual escrevo este post centra-se no facto de, após um certo “desconforto” ou “inadaptação” face à desordenada ocupação urbanística de Tenerife e de um modo geral à “modernidade”, pelo menos era essa a explicação que encontrava para o “sentir” das outras vezes (!), me ter “reconciliado” ou “focado” no espaço e no tempo! Na verdade, descobri uma nova forma de vivenciar o espaço, assente no presente, mas sentindo ou procurando sentir o passado, com base nos numerosos testemunhos… guanches e, claro, nos quais as cuevas ocupam um lugar preponderante.
Já durante a primeira visita tinha comprado um livro acerca das pinturas rupestres em cavidades artificiais, mas foi somente durante esta última que descobri e, sobretudo, senti a intensa e multifacetada presença do espírito guanche. Desde logo na rica toponímia local, mas não só… Foi desta feita que descobri a Tara – a grande mãe ou deusa da Terra –, o panteísmo ou animismo desse povo que expressava um culto ao ar livre fortemente ligado a grutas, montanhas, fontes, “pedras espirituais” ou “rochas animadas”. Tais concepções não resultaram do facto de estar uma lua-cheia fascinante ou de se comemorar o Samhain, a festa do ano velho e o começo do novo, ou até de se celebrar o começo do Inverno, numa fronteira entre mundos, mas certamente terá ajudado...
Esta terceira viagem fechou um ciclo mas abriu, sem dúvida, um outro. Esta que foi uma viagem essencialmente no self – nas profundezas do ser – terá, assim espero, tradução sob a forma de futuras aventuras no terreno em busca desse espírito da Terra só agora aflorado… Um caminho que levará, mais uma vez, ao alto de montanhas e às profundezas de grutas.


Vista do Teide, ao final do dia, desde Orotava (PC ã 3/11/2012). 



"A mi entender, esta abundante presencia de símbolos mágicos con un gran significado en determinados lugares (imaginización) o de construcciones como los templos redondos, los círculos de piedra y los altares para ofrendas son elementos que poseen una gran relevancia. Imaginizar significa percebir la magia y las irradiaciones de un lugar y añadir una imagen exterior, visible para todos, a la imagen generada en nuestro interior como consecuencia de dicha percepción.
(...)
Nuestros antepasados estaban en perfecta comunicación con cada una de las manifestaciones naturales y con cada elemento, tanto con el manantial como con el viento, mediante las incisiones, dibujos y pigmentos que hacían en la piedra. Se sentían unidos tanto a lo animado como a lo inanimado, puesto que para ellos todo lo que existía tenía vida, las piedras, la tierra, el cielo y el mar.
La religión de la cultura atlántica occidental - y también esto es un rasgo típico de los aborígenes canarios - se practicaba al aire libre. Los altares se dejaban vacíos pues eran reservados como asientos para los dioses, igual que los roques, y si se llegaban a erigir ídolos (como los "efequenes" de Fuerteventura o la "figura femenina" de Tara, en Gran Canaria), tales actividades se hacían al aire libre.
(...)
La madre ancestral de Tara, hallada cerca del municipio de Telde, Gran Canaria, es considerada, por lo general, una escultura de la máxima elegancia y gusto refinado desde una perspectiva estética. Dicha estatua se exhibe actualmente en el Museo Canario de Las Palmas de Gran Canaria. Esta escultura ha ido adquiriendo cada vez más importancia ya que la palavra "tara" en la lengua de los aborígenes canarios significa "símbolos para recordar" o "escrita". İ Todos los petroglifos son "taras"! "Tara" es pues una palavra preindoeuropea de extraordinaria transcendencia."

Harald Braem in Tras las huellas de los aborígenes - Guia arqueológica de Canarias (Zech, 2010, p. 33-35)


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